segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Afinal, o que querem as mulheres?

Ao longo dos últimos dias acompanhei a microssérie “Afinal, o que querem as mulheres?”, transmitida pela Rede Globo em 6 episódios e dirigida por Luiz Fernando Carvalho. A história tem como personagem principal André Newmann, um psicanalista que elabora seu doutorado tentando responder à pergunta que dá nome à série e que, além disso, é um dos principais questionamentos do trabalho de Freud, sempre presente na história da psicanálise. Mas, obviamente, este é um assunto que surgiu muito, muito antes de Freud e suas descobertas...


Quando vieram me falar a respeito desta série, fiquei curioso. Foi interessante saber que veiculariam na tv aberta um seriado com uma das temáticas principais remetendo à psicanálise. Certamente, referências psicanalíticas (e, destacadamente, Freud) tornaram-se ícones da cultura popular e não é de hoje que eles aparecem em obras de ficção, documentários, notícias etc.
Porém, é muito delicado levar ao grande público um assunto tão diverso. O trabalho na psicanálise é um trabalho que causa espanto e choca quem se propõe a escutar, pois é um trabalho que envolve aquilo que não se diz, que não se pode dizer ou, ainda, que não se sabe dizer; o que pode gerar precipitações, conclusões e convicções que muito fogem da proposta original.
Exibiriam um seriado, e não um seminário psicanalítico. Ainda que fossem levantadas questões de cunho psicanalítico, estas não seriam aprofundadas o suficiente para evitar desarranjos de entendimento. Mas uma informação me tornou mais esperançoso: o diretor seria Fernando Carvalho. Acompanhei sua microssérie anterior na Rede Globo, “Capitu”, baseada na obra de Machado de Assis. Hoje, após um ano desde sua exibição, ainda não tenho palavras para descrever o quanto me apaixonei por aquele trabalho.
Por ser um excerto da obra de Machado de Assis levada ao grande público, também foi receoso imaginar qual tipo de reação aquela série causaria. Mas o resultado foi incrível, sensacional, inconfundível; não há com quem eu fale a respeito e não ouça ótimos comentários. Se o diretor e sua equipe souberam lidar tão bem com Machado de Assis, por que não o fariam novamente, desta vez envolvendo parte do trabalho freudiano?
Fico feliz em dizer que o resultado de “Afinal, o que querem as mulheres?” muito me agradou. Trata-se de uma história cujo desenrolar se dá como em qualquer outra história contemporânea, sobre relações e costumes, romance, família, profissão e conflitos, porém, carrega consigo detalhes e falas muito pontuais, eu diria, pois sempre remetem às questões da feminilidade, da “invenção” e constante atualização da mulher e o quanto isto se insere, direta ou indiretamente, no cotidiano de qualquer pessoa. É interessante observar na série, também, que várias referências ao feminino se desdobram para além da psicanálise, muito transitando no terreno da arte, por exemplo.
Demonstra-se, de uma forma muito bonita, que é antecipada a pergunta sobre o que querem os outros, pois em sua origem centra-se a questão “o que eu quero?, o que eu desejo?”. Che vuoi? é o que Lacan (que aparece na série sob a forma de um engraçado e caricato boneco animado, junto a Freud, Jung e Reich) utiliza para designar este questionamento.
Recomendo a todos que assistam a série. Seja pela psicanálise, seja pelo potencial e beleza artística, seja pela simples curiosidade corriqueira, seja para passar o tempo ou nem que seja para instalar a pergunta em si: “o que queres?”


3 comentários:

Mayara Lopes disse...

Assisti poucos capitulos, mas me pareceu muito bom mesmo.

Guilherme Catanante disse...

Tente assistir os demais capítulos, vale a pena :)

Dan Gutierrez disse...

Me parece que, no final, tentaram alongar a série, criando novos capítulos, de forma repentina.

Mas os trabalhos de Luis Fernando de Carvalho primam muito pela beleza estética -- usando o lúdico com sucesso -- e pelo enredo. Percebe-se que um elenco famoso não é seu foco, já que seus protagonistas normalmente são gente desconhecida, como é Michel Melamed (que também fez o Bentinho, em Capitu) e é um dos grandes -- novos -- gênios da cena e da música. Saibam mais em http://migre.me/3tnOu e em http://migre.me/3tnQs. Vale comentar que vi uma entrevista dele pra Marília Gabriela no GNT e, como todo bom gênio, ele é louco. (Foi impossível não observar dessa forma, Gui. Desculpa.)

Vamos esperar pelas próximas boas (raras) obras da Globo.

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